Acho que eu quero falar um pouco sobre o Raphael Draccon

Thiago Carvalho Gonçalves
6 min readJan 3, 2021

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Este é o quinto texto que escrevo para a matéria “Discurso Literário: Criação, Edição E Consumo”. O tema desse texto seria exclusivamente sobre questões de autoria. Eu digo “seria” porque 2021 acabou de começar, eu estou mais perto dos meus 30 do que eu gostaria, só sai de casa seis vezes nos últimos 8 meses e o livro final da saga que fez eu gostar de ler (e por consequência cursar letras) foi lançado após 12 anos e isso tudo combinado está me fazendo pensar bastante sobre o passado. Então… Acho que quero falar um pouco sobre Raphael Draccon.

Ok… Falando desse jeito parece até que eu quero acusar ele de alguma coisa, mas não é o caso. Entre 2011 a 2015(?) eu fui o maior fanboy do Draccon do planeta. Note que eu não digo “Dragões de Éter” (que eu também era super fã), mas “Draccon”. Eu lia todas as resenhas sobre os livros deles, todos os posts de seu blog pessoal, suas colunas em outros blogs, suas redes sociais ,escutava todos os podcasts que ele participava e assistia as palestras de escrita literária. Emprestei e presentei seus livros mais vezes do que consigo lembrar.

Hoje, olho para os livros que fizeram tanto por mim e sinto quase nada.

Meus oito romances de Raphael Draccon empilhados

Talvez o problema seja o cinismo que acabou crescendo em mim nos últimos anos, mas quando lembro de frases “inspiradoras” dos livros de Draccon, elas me soam como frases de coaches. E diversas vezes quando algumas cenas e falas aparecem em minha memoria, elas são acompanhadas de um “isso é um pouco problemático, né?”

Mas acho que o motivo de eu não gostar mais dos livros é bem mais simples. Os enredos e personagens das historias do Draccon não me cativam mais.

Eu não ter gostado do primeiro romance de sua nova trilogia, ter assistido a não boa serie de TV “O Escolhido” (roteirizada por Raphael) e o fato de eu rever os personagens que eu amava da saga inicial e não sentir nada me fez perceber que eu não me interesso mais pelas historias do Draccon.

Não acho que o Draccon seja uma pessoa ou um escritor ruim. É engraçado que o quarto livro da serie Dragões de Éter tenha sido lançado 12 anos depois do ultimo. Alguns personagens passam por arcos que giram em torno justamente de eles confrontarem as ações problemáticas dos livros anteriores. Por isso culpo as partes problemáticas mais a época em que os livros foram escritos do que no autor (embora ele tenha feito besteiras novas neste ultimo livro também).

Além disso, mesmo gostando menos dos livros do Raphael, é inegável a sua proeza de fazer você continuar a virar paginas e não largar o livro. Os capítulos curtos, descrições rápidas e o charme do narrador fazem o livro caminhar de maneira rápida.

Nas aulas de “Discurso Literário: Criação, Edição E Consumo” conversamos bastante sobre os sistemas de relação no mundo editorial, e muito sobre o que constitui um autor. Cada autor tem uma relação muito própria em relação ao seu lado escritor, o seu lado pessoa e o seu lado inscritor.

Quero explorar esses atributos na figura Raphael Draccon, mas eu não consigo falar sobre ele em 2021.

Mas posso em 2011.

Então acho que vou ter que aproveitar essa nostalgia que eu estou passando e vou ter que levar você até a minha adolescência (espero que você não morra de tédio). Mas fique o alerta: algumas coisas eu vou dizer de memoria, então não confie 100% no que eu disser, ok?

Tudo certo para partirmos? Então vamos.

É um…

É dois…

É três.

Sabe quando o Holden Caulfield termina de ler o livro que havia pegado na biblioteca e te diz que ele adoraria ter o telefone do autor para bater um papo? Imagina agora se isso de fato acontecesse e ao final do livro o autor conversasse casualmente com você?

Após o fim do enredo da segunda edição de Dragões de Éter: Caçadores de Bruxas existem cinco paginas em que o autor do livro escreve de maneira amigável sobre o que o motivou a se tornar um escritor e sobre como ele enxerga o universo ficcional que havia criado.

Primeira pagina da descrição de como Raphael Draccon se tornou um escritor

Esse texto, logo após a leitura do livro, é um ótimo jeito de você não separar a obra que você leu do autor que a escreveu. Você agora “conhece” quem escreveu o livro e “sabe” o que ele pensa sobre o próprio livro. Estas aspas estão ai porque, obviamente, você sabe apenas o que o autor e o aparelho editorial querem que você saiba.

Na orelha do livro há o link para o site do autor. No site você encontra posts, artigos e links para as redes sociais (a partir da mudança para a editora Rocco e Melhoramentos há também o perfil de twitter). Igual aos outros autores dessa geração, existe um convite para que o leitor continue interagindo com o autor do livro. E sabe o que é o melhor? Ele responde!

Isso constrói a imagem de ser uma pessoa acessível, já que… de fato ele era pelo ambiente das redes sociais. Lembro de ter mandado um email para ele perguntando sobre o trabalho de editor e ter recebido uma resposta. Minha prima chegou a ter uma breve conversa com ele através de tweets.

E não é só isso. Os fãs dos seus livros eram homenageados em seu livro e blog. Alguns personagens foram batizados com nomes de fãs, um concurso cultural fez com que uma fanfic se tornasse canônica no mundo de dragões de éter, uma fã escreveu uma redação defendendo que um casal seja formado na historia e essa redação foi publicada no blog de Draccon.

Mas o próprio conceito do mundo de Dragões de éter “coloca” o leitor na obra. Resumindo, os personagens do livro ganham vida porque alguém está lendo o livro. Isso faz com que o leitor seja considerado pelos personagens da historia como um semideus.

Ele se tornou, de certa forma, uma espécie de celebridade… O próprio nome “Draccon” é um pseudônimo mais chique para um autor de livros de fantasia.

Eu acompanhei sua trajetória porque a imagem publica dele era muito interessante (principalmente para um garoto que na época pensava em tentar viver de historias). Lembro dele ter dito que conversava sempre com seus editores para que o “A Guerra dos Tronos” fosse publicado no brasil (antes do lançamento da serie), Lembro quando um livro dele apareceu em uma novela (segundo ele não foi merchandising, o diretor da novela gostou do livro e fez a personagem lê-lo e falar do livro), lembro de sua reação feliz quando Emicida o colocou em uma musica (na musica “Oito”), quando ele se tornou chefe editorial de um selo da editora Rocco dedicado a publicação de autores brasileiros de livros de fantasia para jovens adultos…

E, como todo autor, ele participava de eventos.

Palestra de Raphael Draccon e Carolina Munhoz em Ribeirão Preto em 2011 em um pequeno salão lotado. A cabeça de um garoto na plateia (que eu acredito que seja eu) está circulada

E autografou os meus livros!

Pagina do livro Dragões de Éter autografado por Raphael Draccon com os dizeres: “Para o querido Thiago, Não importa em que, Não importa o quanto, Acredite…” com a data 01/06/11

E foi muito bacana! Não tinha tantas pessoas na fila então ele e sua futura esposa e também escritora, Carolina Munhoz, ficaram conversando com os fãs. Mesmo hoje, não gostando mais dos livros do Draccon, eu fico extremamente feliz com esse dia.

Ele tinha tirado uma foto comigo também. Mas eu não tinha levado a minha câmera digital, então ele tirou com a dele e postou no facebook. Essa foto não está mais lá e eu nunca cheguei a baixar ela (minha baixa autoestima da época me “proibiu” de baixar ela…).

Acho que já está bom de Thiago adolescente por hoje. Vamos pegar essas lembranças e tentar tirar alguma conclusão sobre Raphael Draccon como autor.

Tudo certo para voltarmos?

É um…

É dois…

É três.

Se existe uma característica que consegue definir a imagem de Draccon no inicio da década passada é a de que ele quer se conectar com seus leitores.

Raphael Draccon tem como imagem publica a de alguém que você possa conversar com (Autor). Seus livros te chamam para conhecer mais sobre está pessoa publica (Pessoa) e os livros (Inscritor) te “colocam” dentro da narrativa.

Não dá para eu, Thiago, dizer o quanto isso é próprio do Draccon individuo. Eu não conheço Draccon individuo. Mas é uma boa imagem publica para um autor.

Nossa… esse não foi um bom texto sobre Draccon, Mas gostei das memorias que ele me trouxe.

E acho que eu estava precisando delas.

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